sexta-feira, 25 de abril de 2025

Um dia com... Ilda Pinto Almeida em "Mexe-te e vive!", nos 51 anos do 25 de Abril

  "Um dia com..." é uma espécie de página de diário, real ou fictício, aqui cada autor pode fazer o relato de um episódio, fazer uma reflexão, colocar um pensamento, uma foto...

Estará disponível todo o ano, independentemente de outros projectos a correr aqui no Blogue. E está aberto a todos, se tiver algo que queira partilhar, pode enviar para geral@tecto-de-nuvens.pt ou tectodenuvens@hotmail.com indicando no assunto "Um dia com...". Podem enviar quantas participações quiserem.

Em mais um 25 de Abril, uma reflexão sobre os abris, vinda do outro lado do Atlântico (por cá, como sabemos, adquiriu-se o direito de não responder aos emails fora do horário laboral; adquiriu-se o direito, não sei se é já um direito adquirido...).


Com a aproximação dos 51 anos de Abril, e ainda em festa pelo seu meio século de Abril, não pude deixar de fazer uma analise aos abris. Palavra que significa primavera, juventude e vida, e que com certeza houve em tantos outros lugares, não precisamente em abril, mas em outras primaveras sonhadoras de melhor vida. Desta forma, desejar-lhes um 25 de Abril sonhador :)


MEXE-TE E VIVE!


"Mexe-te e vive", diz o mundo
Enquanto te empurra para a estrada do stress
Onde a velocidade é a regra
E a pausa é sinónimo de fracasso

“Mexe-te e vive”, mas não esqueças
De pagar as contas, de cumprir as metas
De ser um robô eficiente, sem sentimentos
E de sorrir, mesmo quando isso te afeta

“Mexe-te e vive", diz o sistema
Enquanto te suga os ossos e te deixa sem sono
Onde a conformidade é a regra, não há sonho
E o protesto é um crime que te deixa com algemas

“Mexe-te e vive”, é o lema da era
Onde a liberdade é uma ilusão, uma farsa
Onde a vida é uma corrida, um jogo de sobrevivência
E onde o prémio para alguns é... mais trabalho!

“Mexe-te e vive” diz o cobrador
Enquanto te cobra os chorudos impostos
E a reforma e o ordenado ficam na mesma
Onde custo de vida te atrofia e o C.O. fica com os bónus

“Mexe-te e vive”, é o lema da máquina
Onde a saúde mental é um mito, uma lenda
Onde a liberdade é uma ilusão, uma miragem
E a sociedade está perdida na inercia do sistema
Onde o prémio é... mais da mesma coisa!

"Mexe-te e vive", diz o chefe
Enquanto te dá mais trabalho e o mesmo salário
Onde a produtividade é a regra
E a criatividade é um luxo que não se pode pagar

“Mexe-te e vive”, mas não te esqueças
De responder aos e-mails às 3 da manhã
De ser um super-herói (ina) do trabalho, sem falhas
E de sorrir, mesmo quando a vida te parece um pesadelo
Onde a vida é uma corrida, um jogo de sobrevivência
E onde o prémio é... mais da mesma coisa!






quarta-feira, 23 de abril de 2025

Dia Mundial do livro_ Desafios de autores para autores: Abril - TEXTO VENCEDOR -

A ilustração do cartaz é da autoria de Rachel Caiano, distinguida com menção honrosa no Prémio Nacional de Ilustração 2024.

                                                                     

O desafio para este mês é livre, um pequeno texto, com menos de 20 linhas. sobre o que quiserem, seja um livro que vos tenha marcado, um pequeno conto de vossa autoria, um pensamento (que pode vir acompanhado de uma foto tirada por vós); o início de um livro que planeiam escrever (ou já escreveram, mas ainda não publicaram)...
Neste dia, em prosa, celebraremos a palavra escrita como forma de comunicação, de expressão de sentimentos, de companhia, de forma de viajar (pela memória, por exemplo), etc.
Como habitualmente, por ser Abril, se alguém se sentir particularmente inclinado a escrever sobre o 25 de Abril e/ou a liberdade (ou liberdades), também o pôde fazer.


Lembramos que até ao dia 15 de Maio teremos uma votação a decorrer para encontrar o poema favorito dos leitores.
Como habitualmente, as votações serão feitas usando a caixa de comentários (já sabem que tem moderação pelo que os comentários/votos não ficam visíveis de imediato), não há limite para o número de vezes que podem votar ou em quem votar, apenas se espera algum bom senso (e apesar de aceitarmos que no blogue as votações ficam anónimas, só validaremos os votos após recebermos por email a identificação do votante e forma de contacto, assim que lhe atribuirmos um número).
O autor do texto mais votado escolherá do nosso catálogo de Prosa um exemplar do livro que mais lhe agradar; e o mesmo sucederá com o comentário/voto sorteado de entre os votantes identificados.

E chegou ao fim mais uma votação(?). Tivemos 4 votos e só dois foram validados... Contudo, houve unanimidade nesses dois votos e o texto vencedor (com toda a certeza apreciado por muitas mais pessoas) é o "Confidências", da Maria João Amaral Graça. À autora, os nossos parabéns!
Quanto ao votante, recorremos ao número de sonho do Eurodreams de 15 de Maio, o número 2, pelo que o votante premiado é o votante nº 2. Também para ele os nossos parabéns.
Muito em breve vão poder escolher um livro do nosso catálogo de prosa.
Aos autores resta agradecer mais uma participação e dizer-lhes que apesar dos votos não o mostrarem, os textos foram lidos por imensa gente.

(6) Abril primaveril (pensamentos)

Março de 74 anunciava novos ventos:

Marcelo exclamou - “E eis que chegou a primavera”. “Começou com a PIDE e os dias cinzentos”.
Mas algures um militar dizia - “Mas o sol virá quando menos se espera”.
Ao que outro mais letrado replicou – “Quer faça sol ou um belo luar. A brisa soprará funcionando como defumo. Inebriando uma nova perspectiva no olhar; despoletando a intuição a indicar o novo rumo.”.
Outro mais erudito respondeu “Seja no oceano ou num rio a correr. Que a primavera traga coragem para ultrapassar os obstáculos que nos prendem de crescer.”.

Que a liberdade de Abril nos faça sonhar

Com a fórmula de não vivermos acorrentados
Mas sem nunca nos levar ao próximo desrespeitar
E a nos podermos exprimir mas sendo moderados.

Aníbal Seraphim


 (5) dona miquinhas do senhor samuel

é necessário frisar que estou a escrever sobre a dona miquinhas do senhor samuel.

porque mesmo abaixo da sua casa existia a miquinhas dos alhos. a casa dela. claro. o senhor samuel era raro vê-lo em casa. saía de manhã para o trabalho. quando voltava já era de noite. tinham uma filha casada. com um senhor da judiciária. a dona miquinhas do senhor samuel uma vez por semana ia a casa dela. e era aí que nós aproveitávamos. nós a rapaziada. no seu quintal havia ao fundo a retrete. como era normal. mas também um coberto. na frente deste uma figueira. ora bem. o interesse pelo quintal da dona miquinhas eram os figos. da figueira. na casa dela era um amontoado de móveis. uma grande mesa. nunca usada. em cima da parede um lindo relógio de pêndulo. para dizer mal. quase que não se podia passar para o quarto. este tinha uma cortina a separar a sala. onde estava a mesa grande. do lado esquerdo. quem entra. era uma cozinha. e no meio. entre a cozinha e o quarto ficavam os degraus. uma escada que dava para um quarto em cima. a casa estava bem equipada.
mas não era disto que queria falar. perdi-me. era dos figos. quando era altura deles. do quintal da miquinhas dos alhos. que nunca estava em casa. passávamos para os figos. e seja dito. limpávamos os figos maduros. mas a nossa alegria era quando chegava a dona miquinhas do senhor samuel. não via figos. protestava. nós de nada sabíamos. eramos muito mentirosos. então ia de casa em casa. e fazia queixa aos vizinhos. era uma alegria para nós. e ainda é. passados tantos anos.

joaquim armindo

dia do livro de 2025

 (4) o senhor cândido

o senhor cândido morava na quarta casa do meu bairro. porque aquilo não era uma ilha. mas um bairro. de pobres. ou remediados. como se dizia. então. lembro-me muito bem. uma casa e um pombal no quintal. porque cada casa tinha um quintal. ainda que a retrete fosse no fundo do quintal. mas era. para se fazer xixi era num bacio. que se despejava na retrete. não havia chuveiro. mas existiam bacias. onde se tomava banho. estou já a desviar a conversa. vamos lá. o senhor cândido vivia com a esposa. quatro filhos. uma era filha. os filhos o telmo. viria a ser presbítero da igreja lusitana. porque todos íamos ao torne. ou quase todos. à escola primária e à igreja. aliás o bairro pertencia à igreja. e ainda pertence. mas o telmo já tinha mais idade que eu. era dos grandes. ainda andei com ele num curso de teologia. foram uns cinco anos. depois havia o nélson. este já da minha idade. jogávamos à bola. na rua. claro. há muito tempo que não o encontro. encontrava-o nas manifestações. ele era de esquerda. e depois o tono. muito mais novo. não me lembro do nome da filha. nem da esposa. o telmo casou. veio residir na maia. com a isabel. ainda falo com ela de vez em quando.

mas o mais importante de tudo era o pombal. pombas muitas. concorriam a concursos. lembro os assobios do senhor cândido. os assobios era para chamar as pombas. depois ficava registado numa máquina os tempos que demoravam. na corrida. quem vencesse tinha um prémio. não sei o que era. mas era uma vida curiosa. que agora não vejo. nem tenho de ver. era o nosso bairro. que não era uma ilha. com o senhor cândido e as suas pombas.

 joaquim armindo

dia do livro de 2025

 (3) Acasos

Acho que há acasos que podem salvar-nos a vida. Os cinco minutos de atraso que evitam que passemos num determinado local. O momento em que nos apercebemos de que nos esquecemos de algo em casa e voltamos atrás. Ou quando nos enganamos e seguimos por outro caminho. E, ao fazermos tudo isto, escapamos a um acidente. É verdade que o contrário também pode acontecer, mas eu, que sou optimista, prefiro pensar positivamente.

23h. Alameda das Linhas de Torres. Sou professora. Terminei as aulas. Despedi-me da turma.
Entro no carro. Saio. Não há trânsito. O semáforo está verde. Vou a ouvir rádio. O meu filho ia estar fora. “Dá-me um toque quando chegares. Eu não atendo, um toque apenas para saber que chegaste bem”; - tinha-lhe pedido, receosa da viagem demorada que ele iria efectuar. Aproximo-me do cruzamento. O telemóvel toca. Abrando instintivamente, como se isso me permitisse ouvir melhor.
Às 23h o meu filho decidiu ligar-me. Às 23h reduzi a velocidade. E, ao fazê-lo, evitei, por centímetros, o carro que passou o sinal vermelho, a alta velocidade, no cruzamento.
Às vezes pergunto-me...

 Lígia Dantas

Abril 2025

 (2) Felicidade

Contei sete crianças e dois adultos ainda jovens (segundo o meu conceito de juventude). Ao meu lado na praia, montaram guarda-sol e abrigos de vento, pousaram geleiras e mochilas, espalharam toalhas. Pensei tratar-se de um casal com filhos e sobrinhos, ou amiguinhos dos filhos. Percebi que não. Eram sete filhos. Fiquei fascinada com a alegre algazarra. Imaginei a logística: as camas a fazer de lavado, as compras no supermercado. Pensei nas brincadeiras, nos risos antes de dormir, nas conversas cruzadas à mesa.

Mais à frente, uma senhora sozinha, com um fato de banho azul escuro e um chapéu largo, lia tranquilamente um livro que interrompia de quando em vez para olhar o mar.
Um pai e um filho louro saltavam sobre as ondas, divertidos. O pai passava a mão pelo cabelo do menino, despenteando-o. Davam abraços apertados. Não sei se eram sempre só os dois ou apenas naquele momento. Não sei se ao final do dia se separariam e aguardariam pelo próximo encontro, com o coração a transbordar de saudade. Fosse como fosse, era evidente o amor que os unia.
Quase de saída, reparei num casal de mais idade, a lutar com uma tenda igual à minha - daquelas que nos garantem serem fáceis de desmontar. Percebi que ele dizia graças de que ela se ria com gosto, que se olhavam por cima do tecido impermeável da tenda que teimava em não fechar. Recordei-me de tê-los visto de mão dada, à beira-mar. Não faço ideia se estariam juntos há muitos anos, mas, muitos ou poucos, pareciam bons.
Pensei o que penso muitas vezes. Que a felicidade pode ser muitas coisas. 

Lígia Dantas

Abril 2025

 

(1) Confidências

Após quinze anos afastada da casa materna, Raquel viajou

de Londres até Lisboa, para rever a mãe, mas ao contrário de
beijos e abraços calorosos, encontrou uma moradia vazia e
sombria, desprovida de calor humano. No quarto da falecida,
entre o espólio de memórias perdidas pelos móveis,
descobriu a fotografia de uma jovem com o rosto semelhante
ao seu, e que tinha algo escrito atrás:
G rande é o meu tesouro
  E xtraordinária bênção de Deus
  M uito mais precioso que o ouro
  E ao qual tive de dizer adeus
  A maldiçoada foi a minha sorte
  S entirei amargura até ao dia da minha morte.
Rute, espero que me possas perdoar, um dia, e que a vida
encontre forma de aproximar o que o destino quis separar. As
minhas filhas gémeas, Rute e Raquel”.
Um segredo revelado num poema comovente, cujas palavras
desconcertantes produziram em si um sentimento diferente.
Regressara com a intenção de reconquistar o amor da mãe, e
partia com a certeza de que na sua vida existia mais alguém.

Maria João Amaral Graça




quinta-feira, 3 de abril de 2025

Desafios de autores para autores: Abril - Dia Mundial do livro

 


A ilustração do cartaz é da autoria de Rachel Caiano, distinguida com menção honrosa no Prémio Nacional de Ilustração 2024.

O desafio para este mês é livre, um pequeno texto, com menos de 20 linhas (podem usar uma folha A5 como referência) sobre o que quiserem, seja um livro que vos tenha marcado, um pequeno conto de vossa autoria, um pensamento (que pode vir acompanhado de uma foto tirada por vós); o início de um livro que planeiam escrever (ou já escreveram, mas ainda não publicaram)...

Neste dia, em prosa, celebraremos a palavra escrita como forma de comunicação, de expressão de sentimentos, de companhia, de forma de viajar (pela memória, por exemplo), etc.
Como habitualmente, por ser Abril, se alguém se sentir particularmente inclinado a escrever sobre o 25 de Abril e/ou a liberdade (ou liberdades), também o pode fazer.


Envie os seus trabalhos para geral@tecto-de-nuvens.pt ou tectodenuvens@hotmail.com