sábado, 25 de maio de 2024

Alexandra Carneiro, autora de "Melinda", em entrevista

 



Alexandra Carneiro é licenciada em Língua e Cultura Portuguesas e esteve ligada à docência durante vários anos. Foi uma das autoras cujo trabalho concorreu ao nosso Prémio de Conto Infanto/Juvenil, 2023, e teve direito à publicação do mesmo na colectânea "Contos Contados e Encantados...". Participou, igualmente, na nossa colectânea do Natal 2023 "Memórias de Natal" (com o conto "Encanto de Natal").
A autora é defensora da fantasia, dos caminhos da descoberta para a felicidade, do sonho ilimitado, bem sedeados na infância e nas boas recordações que guarda dela. Não é por acaso que a sua "Melinda" anseia, acima de tudo, voar, que será a representação mais eficaz da liberdade, da ausência de limites físicos e do perfeito misturar de fantasia e realidade.
Mas deixemos que seja esta talentosa escritora, de 42 anos, a falar da sua escrita, de voz própria e na primeira pessoa...

  Conte-nos como e porquê começou a escrever, por paixão ou por necessidade?

Comecei a escrever por necessidade. Nasci e cresci numa aldeia minhota. Vivia numa casa cheia de muitas conversas e de histórias cruzadas e amadurecidas entre gerações, com muitas gargalhadas, muita azáfama à boa maneira do Norte: numa dinâmica muito própria, de muita partilha, de muita interação com os vizinhos, uma vida muito vivida uns com os outros, sem monotonia ou falta de companhia e muito menos de conversas. No momento em que me caso, sigo outro caminho e vou viver para outra cidade, onde não conheço ninguém, sobram palavras, mas faltam pessoas. Percebo, assim, no meio deste silêncio e desta solidão que eu sou a minha melhor companhia. Embora não tenha com quem conversar, descubro muitas histórias dentro de mim a brotarem, a quererem ganhar vida. Estiveram lá desde sempre, desde a infância e eu só precisei deste encontro comigo e com este lugar despovoado das minhas pessoas para as ouvir. Por isso, a escrita começa com esta necessidade de encontrar uma companhia para mim e com a precisão de me ouvir e de me redescobrir, ao permitir ter acesso a este acervo interior e a esta viagem ao que sou e tenho. E a partir daí, inicio esse registo e começo a dar-lhes vida através das minhas palavras.

  Qual o papel que a escrita ocupa na sua vida?

A escrita tem sido uma forma tão profunda quanto honesta de estar comigo.  Escrevo aquilo que eu sou e que tenho dentro de mim. A palavra escrita é uma companheira, testemunha, confidente e terapia em vários momentos da minha vida, seja em celebrações, em fases menos bonitas ou até trágicas, mas que encontro no registo escrito esta cumplicidade e esta profundidade. É, da mesma forma, legado e eternidade, pois tenho na palavra escrita a mais bela herança que deixarei ao meu filho.

   Sempre sonhou publicar um livro? /Publicar um texto num livro?

Não. Sempre gostei muito de ler. A leitura foi a minha primeira paixão e uma companhia insubstituível em diversos momentos da minha vida. Nunca ambicionei escrever um livro, pois achava que esse dom estava destinado a seres superiores, entidades quase divinas; alguém que já tinha vivido muitas vidas e que, por isso, teria muito para contar, para dizer aos outros. Eu estaria noutra categoria: a dos leitores, aqueles que se deslumbravam, sonhavam e deleitavam com as palavras e histórias que tinham sido escritas, até ao dia em que escrevi também eu uma história e alguém a leu. Muitos leitores a ouviram e tantos outros sentiram exatamente o mesmo que eu tinha sentido em relação a outros autores, deixando-se levar e sonhar através das minhas palavras. Aí, sim, percebi que havia público para a minha história e que ela merecia um livro.

  Qual é a sensação que tem ao ver, agora, o livro nas mãos?

Ao ter um livro meu nas mãos, sinto que posso partilhar com os outros o melhor que tenho e sou, o que mais gosto de fazer, como se fosse um tributo à vida e a tudo o que tenho vivido, aprendido, sonhado e que passa a estar ao dispor de outras pessoas, através desse objeto tão vivo, belo, sério, requintado e eterno: um livro. Um livro será sempre a materialização de um sonho.

   Tem algum projecto a ser desenvolvido, actualmente? Pensa publicar mais algum livro? Continua a sentir vontade de escrever?

Continuo a sentir vontade e necessidade de escrever. Tenho muitas palavras guardadas no coração, no computador e em cadernos avulsos de muitas páginas manuscritas. Gostaria, naturalmente, que essas palavras dessem origem a histórias que chegassem ao coração de muitas pessoas, embora não tenha, por agora nenhum projeto definido.

  Fale-nos um pouco sobre o(s) seu(s) texto(s)

ü  «Melinda»: Trata-se de um conto infantojuvenil que aborda a persistência, o sonho e a imaginação como as grandes alavancas da infância. Nele ecoa aquele querer desmedido, sem limites nem fronteiras e a luta e perseverança para a sua concretização. «Melinda» é uma voz infantil que nos fala ao coração e que nos vem confirmar o que dizia Walt Disney: «se é possível sonhar, é possível realizar». Melinda, a personagem que dá nome ao livro, é essa voz firme. Esta personagem é também o símbolo da infância no seu estado mais puro e primitivo, no contacto próximo e genuíno com a natureza e com a sua aldeia, a comunidade envolvente que participa e enriquece esta história vivamente.

ü   «Encanto de Natal»: Este conto de Natal é um texto profundamente marcante e comovente para mim. Escrevê-lo significou regressar à escrita e ao conforto de um tempo muito feliz, inocente e pueril (o passado), durante um período de dor implacável causada pela perda da minha mãe e pela vivência desse luto (presente). Mais uma vez aqui, a escrita a firmar-se como um momento terapêutico, catártico e um pretexto precioso e necessário para fazer essa viagem de regresso à felicidade e à magia da infância e do Natal em todo o seu esplendor. Esta narrativa nasce de um lugar de conforto pela presença doce e sublime da minha mãe durante todo este processo criativo. Além disso, é uma história que nos transporta para a década de oitenta, em que o mundo era um lugar bem diferente do de hoje: a felicidade nascia de tanta espontaneidade e simplicidade, que quando aparecia sob a forma de uma construção era o resultado de muito esforço, trabalho e abnegação. O pouco transformava-se em muito; em tudo, até. A valorização desse esforço, o espírito de união, de conquista, o encantamento que se aconchega num lar em época natalícia são valores que iluminam este texto. É pelos olhos graciosos (e também algo cobiçosos!) de uma criança que somos convidados a eternizar estas memórias simples de um Natal verdadeiramente feliz.

 

  Existe alguma parte do texto, em particular, que goste mais. Porquê?

Gosto muito de cada história minha como um todo. Olho para elas com uma visão integrada e integradora daquilo em que eu acredito, até porque reconheço esta coesão e coerência entre os vários momentos que as constituem e que se alinham com a forma como eu olho para a vida, penso e escrevo as histórias.  Esta harmonia baseia-se, sobretudo, na verdade que existe entre Melinda e aquilo que eu sou: a menina que continua a tentar, a tentar, a lutar; a menina que sonha e parte em busca de alcançar o seu objetivo, de dar verdade ao seu sonho, fruto da determinação, otimismo e persistência. Posso, ainda, destacar a referência/ a analogia que encontramos com a mitologia grega e com a lenda de Ícaro. Finalmente, este texto tem a capacidade de realçar este desejo antigo de o ser humano almejar a proeza de voar, de se elevar nos céus. Melinda é a metáfora da força empreendedora que quero continuar a ter para elevar os meus sonhos ao digníssimo estatuto de realidade. No caso do texto «Encanto de Natal», aprecio a envolvência tão doce e tão pura que atravessa esta narrativa. Não posso deixar escapar, porém, um conjunto de tradições natalícias que aqui são recuperadas e, portanto, revividas através de um retrato fiel do Natal da minha infância. E havia Natal mais bonito…? Seguramente que não.

 

  Indique as razões pelas quais aconselharia as pessoas a ler o seu texto? O que acha mais apelativo no seu texto?

Esta é uma resposta muito difícil e de grande responsabilidade…  

Aconselharia as pessoas a lerem os meus textos porque apelam sempre à descoberta de um caminho feliz, tendo como fonte de inspiração a minha infância, as minhas emoções, o meu olhar sobre o mundo, sobretudo, o mundo interior. Ler os meus textos é simplesmente fazerem este caminho comigo, ouvirem a minha voz, mesmo que não me conheçam. É relembrarem o poder do sonho, abrindo o seu coração e deixando-se abraçar por este encantamento que vive em nós e que tantas vezes é esquecido porque somos um lugar de histórias bonitas e os meus textos levam-nos até lá.

   Qual é o seu estilo de escrita ou que tipo de mensagem gosta de passar no que escreve?

Gosto de escrever para a infância e quero acreditar que o faço, independentemente da idade de quem lê os meus textos. Gosto de convocar os meus leitores para a sua infância. Por isso, o meu objetivo será sempre despertar nos corações que me leem ou que me ouvem essa vontade consciente ou inconsciente de regressarem a um lugar que os provoca, que os incita, interpelá-los a algo, seja através do resgate de memórias, de um sorriso no rosto, da reprodução de um momento... Não tenho a pretensão de passar uma mensagem, mas antes apelar à reflexão, à evasão e talvez (se possível) à alienação dos problemas perturbadores do momento presente. Gosto de escrever histórias felizes, bem-humoradas, por vezes, descabidas e inesperadas, de ser autora de mundos possíveis, de experiências de contentamento, de dar passos silenciosos com as palavras, mas que ecoem de forma profunda no ser humano, seja criança ou adulto. E penso tê-lo conseguido nos livros e textos da minha autoria já publicados «Lucas no mundo da lua» (2020); «Amor a meias» (2023); «Melinda» (2023) e «Encanto de Natal» (2023).

   Qual o papel das redes sociais na vida e na divulgação da obra de um autor? E na sua?

Considero inegável o papel das redes sociais na divulgação e promoção da obra de um autor. Além disso, as redes sociais proporcionam o contacto e uma conexão muito positiva entre interesses comuns, seja autores e leitores, seja entre autores, apenas, ou editoras e autores, por exemplo. É um mundo de informação e partilha que está à nossa disposição e do qual poderemos tirar proveito.

Alguns leitores contactam-me através das redes sociais, dando-me conta de que exploraram uma obra minha em determinado contexto, o que me deixa muito muito feliz e prestigia o meu trabalho, sem dúvida. Também enquanto leitora, gosto de o fazer e, por diversas vezes, já usei as redes sociais para parabenizar um autor pela sua obra. A última vez que estabeleci contacto foi com a autora da obra «Gustavo e a oficina mágica», de Marta Coruche, um conto infantil da Editora Tecto de Nuvens que muito apreciei. Esta interação e aproximação entre autor e leitores e vice-versa é evidentemente muito positiva e enriquecedora. Também aproveito as redes sociais para publicar e divulgar atividades que eu vou dinamizando à volta dos livros (literalmente). Sendo assim, é na conta de instagram m.alexandracarneiro que me poderão encontrar.

   Gosta de ler? Que tipo de leitor é que é?

Sim, gosto muito de ler e privilégio literatura infantil ou os autores clássicos. Não leio tanto como gostaria nem com uma continuidade regular, até porque não olho para a leitura como uma obrigação ou como uma lista que tenha de seguir para cumprir metas ou objetivos. Nada disso, para mim ler é entregar-me a outras vidas, a outros enredos. Gosto de terminar um livro e ficar a morar na história, a desfrutar do deleite que aquela experiência provocou em mim. 



 

Contos Contados e Encantados – Contos Infantis -Vários autores

PVP: 12,00€
178 páginas, capa mole; Tecto de Nuvens, 2023

Jovem leitor, esta prenda é para ti, 6 bonitas histórias para leres e releres ao longo da tua vida.(…) E que sonhes, sempre! Sonha um mundo bom, com gente que se ama, se respeita e se ajuda e estarás mais perto de o tornar realidade.
E que estes Contos sejam muitas vezes Contados e sejam sempre Encantados.


Livro disponível nas principais plataformas nacionais e internacionais e na nossa loja online.

Pode encomendar enviando email para loja@tecto-de-nuvens.pt

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