Páginas

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Mariana Manaia, ilustradora, em entrevista.

  Há crianças que sonham em ser famosas, em ir à lua, conhecer esta ou aquela personagem (real ou imaginária)... E há aquelas crianças que criam mundos e lhes dão vida através dos desenhos. Com sorte mantém-se sonhadoras e talentosas e, de vez em quando, batem-nos à porta...

E assim temos a história desta jovem ilustradora, nascida em Coimbra e criada em Leiria. Este ano de 2025 esteve connosco e ajudou-nos com a criação de vários mundos: o de um robô muito capaz; o de um bosque mágico e o sempre fantástico mundo da mitologia sebastianista.

Ainda teve um bocadinho de tempo para criar um belo postal de Férias, co-vencedor do nosso Desafio de Julho. 

E é pelos seus lápis e pincéis que vai ser colorida esta entrevista em que fala dos três livros em que trabalhou este ano. Mariana Manaia por voz própria e na primeira pessoa:

       Conte-nos quando é que começou a desenhar e quando é que começou a usar o desenho para ilustrar algo?

Eu desenho desde que me lembro! Se formos a ver, todos nós desenhamos, e somos artistas em criança. Eu nunca deixei de desenhar, sempre foi parte de mim. Usar o desenho para ilustrar histórias é algo mais recente, o meu primeiro livro ilustrado foi “Um sonho GIGANTESCAMENTE transformador” da autora Suzana de Freitas, que foi publicado este ano, em Janeiro. Foi muito gratificante e estou neste momento a trabalhar para fazer da ilustração o meu trabalho a tempo inteiro. Felizmente, desde aí já consegui fazer alguns trabalhos com a Tecto de Nuvens a quem agradeço a confiança e o apoio. Muito obrigada.

       Qual o papel do desenho (e da arte em geral) na sua vida?

Quando sou criativa é quando me sinto mais alinhada comigo mesma e mais feliz. Desenhar é uma forma de expressão e é também uma forma de “escape”. Eu tenho uma mente muito ativa, penso muito, imagino muito e tenho muitas ideias o que é muito bom mas também se torna difícil às vezes. Quando desenho, é algo automático e intuitivo e a mente desliga. Tudo o que interessa naquele momento é o que estou a criar. E quando acabo uma ilustração sinto uma sensação de conquista e de orgulho, o que também é agradável!

       Como é que faz a ilustração de um livro? É um processo “técnico” (no sentido de regras, equilíbrios…) ou mais intuitivo/emocional (do género “consigo visualizar esta cena”)?

O meu processo começa sempre pela leitura do livro. Eu imagino, na minha cabeça, as cenas a desenrolar como um filme. E depois tento traduzir para o papel as cenas chave do “filme” que melhor representem o texto. Só depois dessa parte mais intuitiva e emocional é que penso como posso melhorar o desenho pensando nas regras dos terços, na teoria da cor e nessas coisas mais técnicas.

       Falando especificamente dos livros “Leonor e o robô Topap” (ilustração e capa); “O Bosque das Palavras Perdidas” (ilustração da capa) e “Eu, El Rei Dom Sebastião, a vós retorno!” (ilustração e capa), qual é a sensação que tem ao ver, agora, os livros, já prontos, nas mãos?

É muito gratificante! Ver o meu trabalho como algo físico e tangível e saber que vai dar a cara a estes trabalhos tão bonitos das minhas colegas autoras é uma honra.

       Fale-nos um pouco sobre o ilustrar de cada um destes livros. Foi fácil, intuitivo?

Há livros mais fáceis que outros de ilustrar, por diversas razões. Às vezes a inspiração atinge-nos imediatamente, outras vezes é preciso explorar diversas ideias. E depois também é preciso que a nossa ideia vá de encontro às ideias e expectativas do autor, o que pode acontecer à primeira (com alguma sorte) ou pode precisar de mais algumas tentativas!

Para o livro da “Leonor e o robô Topap” foram precisas várias tentativas para o design final das personagens. Especialmente para o robô Topap. A maneira como interpretei o robô estava longe daquilo que a autora e a editora tinham imaginado. Foi preciso refazer várias vezes o esboço e, ao mesmo tempo, partes do texto que descreviam o robô foram retrabalhadas para chegarmos ao produto final. Mesmo com todos estes percalços eu gostei imenso deste trabalho. Acho que nunca tinha desenhado um robô, por isso foi um desafio engraçado! Para além que gostei imenso da história.

Para o livro “O Bosque das Palavras Perdidas” foi algo muito intuitivo. A autora Helena Ferreira tem um dom para a descrição, o que tornou o meu trabalho muito fácil. O desenho foi feito de início ao fim sem ser preciso uma única alteração. Um daqueles casos em que a ilustradora tem muita sorte!

Por fim, “Eu, El-rei Dom Sebastião, a vós retorno!” foi o meu primeiro livro com a Tecto de Nuvens fora da categoria infantil. A autora tinha muitas ideias desde início, o que poderia correr bem ou mal! Será que conseguiria ir de encontro às expectativas? Correu tudo bem felizmente, as ideias da autora eram muito interessantes e algumas iam de acordo com o que eu já tinha imaginado. A autora falou num nevoeiro e um cavaleiro, e eu imaginei logo uma capa que fluísse para a contracapa, uma ilustração única. Mais tarde surgiu a ideia da coroa que eu também incorporei. A editora Teresa também foi essencial para este trabalho, foi a ponte entre mim e a autora e deu ideias muito valiosas que levaram a uma das capas mais bonitas que já fiz (na minha opinião claro)!

       Existe alguma parte de cada um destes livros, em particular, que a toque mais. Porquê? Influenciou o estilo/escolha do traço?

Para o livro da “Leonor e o robô Topap” a cena final foi a mais marcante para mim e é a cena que deu origem à capa. Os dois parceiros triunfantes, tendo cumprindo a sua missão, foram o foco desta ilustração. O design destas personagens, como falei anteriormente, foi algo que precisou de várias tentativas, por isso também eu me sinto triunfante de os ver assim na capa!

“O bosque das palavras perdidas” tocou-me especialmente pela imersão que tive ao ler este livro. Deu-me imenso gosto ler, e relembrou-me das minhas sessões de leitura em criança. É um livro muito bonito e com uma mensagem muito importante. Para este livro quis me focar em trazer alguma magia para a capa para refletir isso, e por isso a luz foi o foco desta ilustração.

O livro “Eu, El-Rei Dom Sebastião, a vós retorno!” foi o meu primeiro livro com a Tecto de Nuvens fora da categoria infantil. Por isso quis fazer algo bastante diferente e apostar tudo no cenário, em vez de na personagem. O resultado foi uma ilustração com algum mistério, e com alguns elementos que representam bem este livro!

       Indique as razões pelas quais aconselharia as pessoas a ler estes livros? O que acha mais apelativo nos livros?

“Leonor e o robô Topap” é um livro engraçado e tenro sobre um robô abandonado e a menina que o encontra e que o ajuda a encontrar o seu propósito. A inteligência artificial, um tema tão atual, é um dos temas centrais do livro. Como podemos utilizar esta tecnologia para o bem da humanidade? Para mim, como ilustradora, é algo tão importante, porque como sabemos a inteligência artificial está a roubar trabalhos artísticos, seja na ilustração, na escrita ou até na música. Trabalhos estes profundamente humanos, que muitos de nós queremos fazer! Mas podemos utilizá-la para fazer os trabalhos que não queremos ou que sejam perigosos para os humanos como iremos explorar neste livro!

“O bosque das palavras perdidas” é um livro lindo sobre a importância das palavras. Eu diria mesmo que é digno de um filme da Disney. A autora transporta-nos para dentro da história com o seu dom da descrição e o livro tem uma mensagem bonita e cada vez mais importante nos dias de hoje. Aconselho vivamente!

E por fim “Eu, El-Rei Dom Sebastião, a vós retorno!” é um livro já para um público mais crescido. Procura responder ao maior mistério da História de Portugal com uma hipótese muito interessante e emocionante. Aconselho a qualquer apreciador de história e de ficção.

       Considera a arte, neste caso não apenas na perspectiva de um apreciador, mas de alguém que “produz” algo, seja um bordado, uma colagem, pintura, desenho, tocar um instrumento, etc, como sendo sempre uma actividade (até na perspectiva de “escape”) recomendável e positiva? Ou é apenas se a pessoa for boa na sua realização? Ou pode ser benéfico mesmo que o resultado final não seja digno de ir para o Museu? Acha que há mérito no processo por si só?

A arte é algo que todos deveríamos fazer, faz parte de ser humano. Pensem nas pinturas das cavernas. A arte sempre fez parte de nós! Hoje estamos muito desligados do nosso lado criativo, por “falta de tempo” ou porque achamos que “só conta se formos bons à primeira”. Mas permitir-se largar a perfeição e ser mau a alguma coisa, pintar fora das linhas, fazer uma cerâmica torta, permitir-nos errar e tentar de novo é algo profundamente humano. Só avançamos, só melhoramos, se tentarmos e não ficarmos agarrados a uma ideia de perfeição que não existe.

O processo criativo, seja por que meio for, é algo muito benéfico para qualquer pessoa. Alguém disse: “A expressão é o oposto da depressão”. Não tenham medo de se exprimir através de qualquer forma de arte. É verdadeiramente libertador.


 





  








 


Sem comentários:

Enviar um comentário