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terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Laura Ramos, autora do livro "Eu, El Rei D. Sebastião, a vós retorno! - edição revista -" em entrevista

 

 O escritor é conhecido pela sua insatisfação, pela vontade de retocar, reescrever, aperfeiçoar, mas também é conhecido pela sua atracção pelo mistério, pelo inesperado, por aquilo que é menos óbvio... Laura Ramos não foge a nenhum destes conceitos e o livro de que agora nos fala é o exemplo disso. O tema fascinou-a, seduziu-a, as circunstâncias permitiram-lhe uma nova edição do livro e, como tal, retocar aqui e ali, sempre na busca da perfeição literária.
E assim, tal como o monarca, também o livro regressa...
A autora não é estranha para os leitores do blogue e já antes nos falou do seu gosto pela escrita e da preferência pelo romance, mas tal como um bom livro, cada nova "leitura" da autora traz algo de novo sobre esta viseense de 56 anos. Aprendemos sobre ela e sobre este regresso do seu "Eu, El Rei D- Sebastião a vós retorno!" enquanto nos fala sobre este assunto fascinante.
Laura Ramos, por voz própria e na primeira pessoa...
 

  Fale-nos um pouco sobre o seu novo livro.

Trata-se de um romance histórico que explora a lenda de D. Sebastião e se apoia na versão de que o rei não morreu na batalha de Alcácer Quibir.
Mistura realidade com ficção. Recria cenas em que são lembrados episódios históricos, situações que aconteceram na realidade e que marcaram a vida, a derrota militar e o espírito do rei.
Ao mesmo tempo, partindo da versão de que o rei não desapareceu em Alcácer Quibir, mas continuou a viver, sem coroa, e partindo das circunstâncias pessoais historicamente conhecidas, tentei recriar o contexto mental e espiritual em que o homem teria mergulhado ao defrontar-se com uma nova realidade de vida.
Procurei ancorar-me nas características pessoais conhecidas ao rei para elaborar os seus sentimentos, ideias e vontades que sejam verosímeis num contexto de sobrevivência pós batalha.
               
  Para além da nova capa, esta versão difere muito da de 2022, ou fez apenas alguns retoques?

Apenas fiz uns pequenos retoques, mas a história permanece igual. 

  Indique as razões pelas quais aconselharia as pessoas a ler (ou dar a ler) o seu livro?

Sempre me apaixonou perceber o motivo que tornou lendário um rei que, na verdade, perdeu a guerra, a coroa e deixou o reino à mercê daqueles que sempre ambicionaram dominar Portugal. Esse gosto talvez seja partilhado pelos leitores.
Vale a pena recordar o clima de mistério e ânsia que rodeou o nascimento deste rei e o seu desaparecimento do trono.
Também vale a pena conhecer a possibilidade de o rei não ter morrido na batalha, o que é uma circunstância admitida por alguns historiadores.
Por outro lado, vivemos tempos de turbulência, incerteza e insegurança. Nessas fases, os povos preferem mergulhar nas suas lendas, onde muitas vezes encontram inspiração e forças para continuar a acreditar no presente e no futuro.
E depois há as razões práticas para ler este livro: é relativamente pequeno e rápido de se ler, tem uma capa linda.
Sobretudo é bom recordar um rei que se transformou num mito ainda hoje presente na consciência nacional. Apesar dos fatídicos factos históricos, o rei D. Sebastião representa a esperança em dias melhores e no ressurgimento nacional. Ótimos motivos para o reler!

  Este livro aborda um dos temas mais fantásticos, místicos e misteriosos da História de Portugal. O que é que a levou a abordar esta temática e o porquê da escolha desta teoria (que embora, provavelmente seja das mais bem suportadas em termos de provas, não é a que a maior parte dos leitores conhecerá, aqui “conhecerá” como possibilidade e não como parte do mito)?

Sempre me fascinaram temas misteriosos e a vida de D. Sebastião deixou-nos como legado um mistério enorme, a esperança de o país ter de cumprir uma obra inacabada. Este rei deixa muitas perguntas no ar, muitos “porquês” sobre a sua existência, sobre as suas escolhas e sobre o destino de Portugal.
Também quis dar vida à possibilidade da sobrevivência do rei, de modo a que as teses que se debruçam sobre isso não sejam lembradas apenas na dimensão do estudo, mas na riqueza do romance que, partindo do conhecido, persegue o desconhecido e dá vida às personagens históricas, tornando-as próximas de nós todos e, dessa forma, podemos melhor compreender quem foram e como pulsaram.
Alguns factos ficcionados assentam mesmo em possibilidades que já vi exploradas. 

  E a forma de narrativa, entre lá e cá, o sonho e a memória? Foi uma escolha natural, intuitiva?

É uma forma de não tornar o livro pesado com pormenores da vida pessoal do rei e das demais personagens, indo buscar as partes que sobressaem na vida das pessoas que um dia estiveram na Terra a cumprir o seu destino e a tecer os fios à nossa meada, enquanto nação. Um livro de História tem de se debruçar sobre tudo, mas um romance vai buscar as partes mais importantes para descobrir as pessoas. 

  Este livro é uma espécie de híbrido entre o romance histórico e o especulativo. O ano passado contemplou-nos com um romance contemporâneo “A Ditadura das Árvores”, o romance é a sua forma de comunicação preferida? É um género a que tenciona voltar?

Sim, sem dúvida que o romance é uma forma de comunicação e a oportunidade de criar. Embora não tenha datas, nem objectivos que pressionem, gostaria de continuar a escrever.
“A Ditadura das Árvores” é um livro sobre o presente e o futuro próximo, os problemas, os medos e as esperanças que a humanidade hoje enfrenta. Acaba por ter pontos de contacto com o livro “Eu, el rei D. Sebastião, a vós retorno”, na medida em que este também viaja pelos medos e esperanças de uma nação.
Ambos encaixam neste tempo de mudanças aceleradas, em que o homem busca o progresso, mas já anseia pelo sentido da sua existência e do futuro. São, pois, ambos livros que têm voz para este tempo.

  Tem mais projectos para livros? Actividades?

Sim, tenho algumas ideias de histórias que gostaria de transformar em romances. Dá-me prazer criar personagens diferentes e que tenham personalidade própria e deixem algum legado aos leitores.

Creio que não vou parar por aqui.



Mais informações sobre o livro aqui.
Leia (ou releia) as outras entrevistas de Laura Ramos aqui e aqui.

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